segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A máquina que move o mundo.




 O que move o mundo não é energia nem amor. O que move o mundo é o egoísmo.
 Ninguém pensa no bem do outro, pensa apenas em si e mascara isso, com sonhos, promessas e delírios. É tudo libido. Desejo de ter, de ser ou estar. Desejo de desejar.
 As pessoas são tristes, solitárias e vazias. E isso é tão difícil de aceitar, assim continuamos pensando que a grama do vizinho é realmente mais verde.
 As pessoas se matam por egoísmo, constroem impérios por egoísmo, conquistam sonhos por egoísmo, amam por egoísmo.
 Tudo que se faz tem a raíz no centro do ego, o mundo é um universo paralelo ao nosso mundo interior. É o espelho dele. Por isso é um caos.
 Para quê se sacrificar tanto? para quê se mortificar tanto? Por egoísmo. É por querer 70 virgens que homens-bomba se explodem, é por querer os céus que se paga o dízimo, é por querer dominar o mundo que se busca conhecimento, é por querer fama que se torna artista, é por querer se ver livre que suicida. Todos egoístas.
 Eu, você, nós. E quando o ego é ferido vem a dor e a irremediável sensação que ninguém se importa com você. Os seus sonhos idealizados escoam e ecoa em sua alma a falta de alguém, e esse alguém é você mesmo. Ideal só existe no mundo das idéias. Um dia talvez possamos calar nosso egoismo.
 Um dia talvez dominarei meu egoísmo e minha infantilidade, quem sabe, ou não. Quer saber? Foda-se.


Muito...



A vida pode ser muito...
muito a suportar
muito a esperar
muito a querer
muito a sentir
muito a fazer
muito a pedir
muito a pensar
muito a decidir
muito a viver
muito...

A vida pode ser tanto
tanto que te leva a desistir...
A abandonar-se a tudo que conseguiu
e aguentar o peso de nada ser suficiente.

Deixar-se levar
pelo tédio insuportável
que te leva a ver que,
indubitávelmente,
todos os dias
e todas as pessoas
são, exatamente, iguais.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Palavra


 O que me resta é escrever, pois não há mais nada no mundo que me encante ou me dê prazer como a palavra.
 As palavras mudam vidas, constroem impérios, carregam o mistério da verdade. Revelam segredos, trazem a tona sentimentos, destroem o que é indestrutível.
 A simples palavra age por caminhos indecifráveis, libertam e aprisionam a alma, enganam e esclarecem. A palavra é tão paradoxal quanto a própria vida, o próprio sentimento, o próprio conhecimento do eu que nao sabe quem sou eu.
 A palavra é a escultura mais perfeita, que pode ser vista de variadas formas, dependendo do olhar de quem admira o quadro. A palavra muda dependendo do tom de quem a canta, por isso é tão vulnerável, bela, decidida e profunda.
 A palavra leva à reflexão, à contestação, à busca pela essência e pelo essencial. Atravessa os séculos, imortal e indolente, displicente e inconsequente, banalizando e concretizando ritos, mitos, criando vertentes.
 A palavra é palavra por si só, comungando todas as fontes de significado. Ela se escolhe, ela se encaixa, se entrelaça, se esconde e se mostra, gerando dúvidas, deixando claro idéias, confrotando-se.
 A escrita foi o resultado da procura do ser pelo próprio ser, e a falta de respostas resultou na arte, que em si já é a resposta para todas as angústias por ser a mistura perfeita de dor e prazer com uma pitada de sonho e a fiel esperança de explicar o inexplicável.

LIMITAÇÃO

 Tento me entender, tento me explicar. É inútil. Ouvi vários adjetivos, várias definições, nada se encaixa em mim, nenhuma transparece o que sou.
 Talvez porque eu seja apenas a inconstância que se alimenta do seu próprio sofrimento e solidão, que tem sede dos seus medos, medo dos seus vícios e é viciada nas suas mudanças.
 Talvez porque eu goste dos meus risos misturados às minhas  lágrimas, talvez porque eu goste dos opostos, ou porque eu venere o que o mundo tem de pior.
 Ou talvez não seja nada disso. Ou talvez o nada seja tudo o que eu sou. Ou talvez eu não seja nada.
 Talvez seja tudo ilusão. O mundo seja ilusão. Eu seja ilusão.
 Talvez nada precise ser entendido ou explicado, porque tudo é a mistura de tudo mesmo refletindo apenas algumas faces. Ou nem isso.
 Talvez eu devesse parar de pensar e devesse aceitar as coisas como são só por serem e nada mais. Porque talvez não exista nada profundo, nada especial.
 Talvez seja simplismente assim, nascer, crescer e morrer e eu deva assumir minhas obrigações como filha e cidadã, futura esposa, futura mãe, futura trabalhadora, e apenas tentar me tornar uma brasileira de bem respeitável.
 Não, alguém me disse que a frase "estou aqui para somar" não é meu perfil. Talvez eu continue eternamente essa batalha com os meus demônios. De qualquer forma não me vejo discutindo sobre o aumento do preço do açucar, nem acompanhando todos os jornais pra saber se descobriram mais algo sobre o último assassinato.
 De qualquer forma não me vejo com uma carreira estável, uma casa, um carro, um marido mais ou menos e alguns filhos para educar.
 Não me vejo representando o papel de mulher feliz na ceia de Natal.
 Não sei para o que nasci, nem se nasci para alguma coisa. A única coisa que eu sei é que eu não quero aquilo que chamam de uma vida estável normal (com direito à viagem à praia uma vez por ano).
 Por enquanto só quero o vento, a noite e a poesia. Um pouco de álcool para alegrar minhas entranhas e, permeando a minha solidão, algumas visitas.

...E eio..






 As luzes se apagam
e as palavras se calam
na virtude de um erro.

 A virtude de não ter virtude,
e se ver cavalheiro errante
prisioneiro de sua loucura.

 No entrelaçamento do comum:
um subterfúgio.
 A esperança, leve e louca, de ser diferente
sendo igual.

 E poder cair no senso banal
de não ter culpa
e de ter prazeres.
De poder sucumbir a si próprio
Perdido no seu próprio devaneio.

 E poder seguir
e continuar.
 Sem ter onde chegar,
sem tempo,
sem medo,
sem receio.

...Acontece...



 Parei naquela praça, para mais uma dose do meu veneno diário, mais uma prestação do meu suicídio e fiquei olhando toda aquela gente, indo de um lado para o outro, descendo e subindo. Para onde seguiam?
 Os mais jovens me faziam imaginar quais aspirações tem na vida, quais eram seus sonhos, suas metas, seus medos. Os mais velhos me entristeciam com as rugas dos sonhos que ficaram para trás. O que teriam perdido?
 Então, imersa nesses devaneios tolos, vindos de nenhum lugar e indo para lugar algum, surgiu um cachorro. Sim, um cachorro desses que vivem abandonados pelo centro da cidade, se alimentando de restos e bebendo a água suja das enxorradas.
 Sim. Era apenas um cachorro. Sozinho. Até que apareceu uma senhora, beirando seus cinquenta anos, e trazia consigo duas sacolas. Sentou-se em um banco próximo e chamou o pobre animal (por um nome que não me recordo) e ofereceu-lhe o conteúdo das sacolas. Comida.
 O cãozinho não aceitou o agrado mas enroscou-se nos pés dela como uma criança que a muito não vê a sua mãe, e ela lhe dirigia a palavra com a preocupação que se tem com um filho. Depois de algum tempo ela se foi. Ele foi fazer seu desjejum.
 Para mim ficou uma pergunta, qual dos dois se sentira mais feliz com o encontro? Ou, apenas, qual dos dois se sente mais sozinho?